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Mineração no fundo do mar: o que vem ocorrendo no mundo?

31 de janeiro de 2024

Mineração no fundo do mar: o que vem ocorrendo no mundo?

A mineração no fundo do mar foi uma das discussões que movimentou o mundo em 2023. Em meio aos debates sobre transição energética de baixo carbono, notou-se a crescente demanda por minerais essenciais para a produção de energia limpa e, consequentemente, a possibilidade de extraí-los em águas internacionais.

Mas como as normas internacionais tratam a mineração em águas profundas? Thiago Maia e Carollina Lagos, respectivamente sócio e advogada com foco em mineração no Demarest, esclarecem a questão ao Valor Econômico.

Autoridade Internacional dos Fundos Marinhos (ISA)

Maia e Lagos explicam que, conforme a Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar (CNUDM) e o Acordo de 1994, a exploração comercial de minérios no fundo de águas internacionais (também denominado como Área) deve ocorrer seguindo regras, regulamentos e procedimentos (RRPs) estabelecidos pela Autoridade Internacional dos Fundos Marinhos (ISA, sigla em inglês). Desse modo, a ISA elabora RRPs em situações em que as considera necessárias ou quando algum país lhe apresenta um plano de trabalho para aproveitamento mineral.

A partir deste pedido, o Conselho da ISA (órgão deliberativo composto por representantes dos diferentes interesses, isto é, consumidores, exportadores e investidores) tem o prazo de dois anos para examinar o plano e adotar as RRPs. Não havendo o cumprimento do prazo, o plano de aproveitamento mineral pendente é aprovado provisoriamente com base em normas já vigentes.

Início de um impasse

Os advogados comentam o que ocorreu entre a República de Nauru e a ISA. Em 2021, o pequeno país de 21 km² localizado na Oceania submeteu à ISA seu plano de mineração no fundo do mar na Zona de Fratura de Clipperton, no Oceano Pacífico, a fim de extrair metais básicos na fabricação de baterias para carros elétricos.

Contudo, o prazo para a elaboração e a adoção das RRPs expirou em 9 de julho de 2023 sem a resposta da Autoridade Internacional. O assunto foi pauta da 28ª sessão anual da ISA, em julho de 2023, ocasião em que o Conselho adiou a adoção das RRPs para a 30ª sessão da ISA, em 2025, estipulando que elas estejam finalizadas até julho de 2024.

A decisão trouxe um clima polarizado à sessão. Enquanto alguns países são favoráveis a uma pausa preventiva da exploração mineral nesta Área para a elaboração de RRPs, outros defendem a sua conclusão o quanto antes.

Por trás da polarização

O Brasil está entre os 21 países que apoiam a pausa preventiva, ao lado de Portugal, Alemanha, Canadá, Chile, França e Suíça. Do outro lado, estão Nauru, China, Reino Unido e México. Maia e Lagos destacam que, mais do que preocupações de cunho ambiental, a polarização reflete os interesses econômicos particulares de cada nação.

“A China, por exemplo, está à frente na corrida pelos minerais críticos, sendo o maior player de terras raras e com alto potencial tecnológico para desenvolver mineração no fundo do mar. O Chile, por sua vez, também se encontra em posição privilegiada, detendo junto com Argentina e Bolívia 65% das reservas mundiais de lítio, mas dificilmente terá as mesmas condições tecnológicas e econômicas da China para a exploração mineral em águas internacionais.

“Vale lembrar que a ISA atualmente possui 30 contratos de pesquisa vigentes, assinados com governos ou empresas que desejam pesquisar no oceano profundo e com patrocínio dos respectivos países, como China, Japão, França, Alemanha, Rússia e Reino Unido. Percebe-se, portanto, que alguns países contrários ao aproveitamento de minerais no fundo do mar são beneficiários de contratos de pesquisa mineral e, inclusive, muitos já realizam extração minerária fora da Área”, explicam os advogados.

Mineração no fundo do mar: a situação do Brasil

A Companhia de Pesquisa e Recursos Minerais (CPRM) esteve envolvida em um estudo sobre crostas ferromanganésicas ricas em cobalto na elevação do Rio Grande, mas concluiu-se que a região faz parte da plataforma continental brasileira, o que permite ao País o exercício de sua soberania conforme a CNUDM.

Quanto a isso, os especialistas do Demarest destacam que o arcabouço legal brasileiro não faz distinção entre mineração no mar e no continente, portanto, a Agência Nacional de Mineração (ANM) é responsável por autorizar a atividade. “Atualmente, existem mais de 700 processos minerários ativos no sistema marinho costeiro do país, com maior relevância na Bahia, Espírito Santo e Pernambuco, e com areia, calcário, ilmenita e fosfato como principais recursos alvos de requerimentos. Até agora, a ANM já autorizou a lavra de calcário marinho e areia”, complementam.

Uma corrida mundial

Os advogados destacam que outros países vêm praticando mineração no fundo do mar em seus territórios – tais como África do Sul e Namíbia com diamantes, Reino Unido e Japão com cascalhos e França calcário marinho –, revelando o que eles chamam de “corrida mundial por outras fontes de extração mineral”.

Inclusive, em janeiro de 2024, após a publicação do artigo por Maia e Lagos, a Noruega aprovou uma lei permitindo a mineração em uma extensa área de 280 mil km² de águas profundas norueguesas, justificada, especialmente, pela necessidade de garantir o suprimento de minerais. A liberação, no entanto, foi recebida com preocupação por ambientalistas que consideram ainda desconhecidos os possíveis impactos à vida marinha.

Segundo os especialistas do Demarest é uma questão de tempo para que a exploração mineral avance para águas internacionais, ainda mais porque o uso de metais e minerais é fundamental na transição energética de baixo carbono. “Esse movimento precisa estar acompanhado de um arcabouço regulatório apropriado, que garanta que essas atividades somente sejam realizadas de uma forma ambientalmente correta”, concluem.

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